29 março 2007

A Desenhadora de Espelhos

da Inês Blu Rodrigues para o João Maria

Não quero falar muito de motas. Por isso começo por aí: porque a mamã tinha uma Bordeaux e eu, uma vermelha. Uma das nossas actividades favoritas aos 16 anos era faltar às aulas de alemão para ir até Almeirim jogar snooker. Andar de mota nos courts de ténis de Santarém, subir todas as ladeiras que podiam ser possíveis com uma acelera (o tipo de mota que tínhamos) e rir à gargalhada sem parar. Chegámos mesmo a encurralar uma velhota que vinha na passadeira: uma de nós passou com a mota pela frente da velhota e a outra por trás, ao mesmo tempo. Não foi muito simpático. A tua mamã que, tinha sempre azar com o seu nariz, conseguiu levantar voo literalmente do banco da mota e aterrar no vidro de trás de um camião. E partiu o nariz. Por vezes à noite, mesmo proibidas pelos nossos respectivos pais lá íamos a Almeirim á noite. A verdade é que nos divertimos muito, João.
O vento que nos cortava à cara em cada viagem, os sonhos que se elevavam quando nos sobrepúnhamos no guiador, as gargalhas que ecoavam na recta do tribunal, as ultrapassagens na estrada de campo para Alpiarça. As nossas motas foram ouvintes das nossas memórias, meios de transporte entre cidades, arquivador de poemas e luzes no lusco fusco. As nossas motas chegaram mesmo a ser transportadoras de bolos, queques, quiches, salgadinhos, tarteletes, tartinhas, bolachas, que a mamã e eu fazíamos para ganhar algum dinheiro para as férias e depois íamos distribuir no infantário onde a minha mãe trabalhava, vendíamos a amigos e trabalhávamos por encomenda. Era um bom negócio que a tia Inês tinha ali onde a mamã participava activamente. As motas serviam também como meio de transporte para dar umas explicações à nossa única aluna - a Márcia, as nossas motas foram quase carroças para nos trazerem das vindimas, onde, eu fui mordida grandemente por uma vespa que na perna - entretanto mudamos de ideias e começamos a ir com outra amiga da mamã - a lurdes - de carro, o mini.
A minha mota vermelha serviu-me de inspiração para escrever um par de artigos sobre a "vespa", umas motas antigas que marcaram o mundo, isto num jornal onde trabalhei enquanto a tua mamã viveu na Finlândia. Um dia mostro-te e explico-te com pormenor, a alma da vespa e o som que faz quando nos fala ao ouvido. Fizemos coisa proibidas, queríamos coisas proibidas, desbravamos caminhos proibidos. Éramos muito novas e isso era uma coisa normal. As motas fizeram-nos felizes.
O teu tio Pedro passou uma grande parte do seu crescimento a ver-nos de um lado para outro com mil ideias e projectos, tinha amigos mais velhos com outro tipo de motas, de vez em quando pedia emprestado a mota à mãe Patrícia e a mim para dar uma voltinhas. A mota só nos transporta mas quem guia somos nós. Há sempre factores externos, pedras na rua, carros que passam, pôr do sol forte em frente a nós na estrada e até um gato bonito a correr à nossa frente. A explicação do mundo e dos acontecimentos não reside em nós, mas aceitação do que o mundo nos oferece está dentro do nosso coraçãozinho.
Mas sabes João, eu tenho uma grande móvel de gavetas na minha cabeça onde guardo as histórias. Tenho muitas para te contar. A maior de todas é resumida na nossa fragilidade como seres humanos físicos mas na nossa capacidade tão infinita de criar sonhos, ilusões e paixões e de continuar a acreditar e prosseguir. E o teu tio Pedro era uma pessoa assim, desenhado à luz da irmã, a tua mãe, à luz do exemplo da beleza da vida, da discrição interior, de saber-se amado com loucura por toda a gente que o rodeava.
O teu tio Pedro, meu querido João, não era só uma pessoa querida simpática, doce, afável ou boa pessoa. O teu tio Pedro era um espelho de amor. Pede à mamã para ir contigo a um espelho e aponta a luz do relógio, o que vês? a luz reflectida em todas as paredes, em todas as pessoas, em todo o espaço em frente ao espelho. O teu tio Pedro era feito de doçura e amor. A tua mãe é a base de tudo isto. Olha para ela, João, não é bonita? A tua mãe constrói esses espelhos. Gosta muito muito dela e põe a chave desse amor no teu coraçãozinho e ela estará ao pé de ti sempre. Reflectida.
posted by Inês Blu Rodrigues

28 março 2007

"Aqueles que nos deixaram
não estão ausentes,
mas invisíveis
e têm os seus olhos cheios de glória,
fixos nos nossos cheios de lágrimas."
Santo Agostinho
posted by Mariana Mendia

04 março 2007


Há alturas em que a dor é tão forte que deixa a tristeza invadir-nos sem dó nem piedade. Ontem foi assim.
Ninguém sabe. Ninguém vê. Sinto falta de te chorar. Como é que estando eu aqui tu não estás? Não era suposto ser assim.
posted by Patrícia Costa Mateiro

Pedro Miguel Beja de Jesus Costa

N 08.04.1983 / F 13.09.2005