10 maio 2007

Quero é Viver

Hoje fui almoçar a casa da Tia Té, já não estava com ela há alguns dias. Fez um almoço óptimo: arroz de peixe com ameijoas. Salpiquei-me toda a comer e tive de subir ao quarto dela para trocar de t-shirt.


Entre muitas outras, encontrei esta foto do Tio Pedro que eu nunca tinha visto. Foi tirada na costa alentejana, no Verão de 2003. Estão os 4 tão felizes! Que saudades de ver o Tio Pedro sorrir assim, de lhe falar, de o abraçar.


Pedi a foto à Tia Té para fazer uma cópia para mim e guardei-a na carteira. Esta tarde olhei para ela uma série de vezes, como se procurasse uma resposta. Não é fácil para o comum dos mortais aceitar ou compreender como é que alguém com tanta alegria de viver perde a vida tão cedo. Tem de haver um motivo, tem de existir algo mais...


Vou viver até quando eu não sei
que me importa o que serei
quero é viver
Amanhã, espero sempre um amanhã
e acredito que será mais um prazer
e a vida é sempre uma curiosidade
que me desperta com a idade
interessa-me o que está para vir
a vida em mim é sempre uma certeza
que nasce da minha riqueza
do meu prazer em descobrir
encontrar, renovar, vou fugir ou repetir

Humanos - Quero é Viver
posted by Patrícia Costa Mateiro


04 maio 2007

Cara Patrícia

Passei pelo seu blog por mero acaso e não pude deixar de lhe dar uma nota.
Afinal, eu sou (era) o Comandante a quem Pedro iria tirar o lugar !
Fui seu formador na preparação para a promoção a bombeiro de 3ª classe e acredite que, assim a vida tivesse deixado, o Pedro era um forte candidato a chegar muito longe na carreira.

Para além de partilhar a certeza da pessoa que o Pedro era/é gostava de lhe dizer que a memória dele vai-me ficar para sempre gravada.
Por múltiplas razões vários foram os Homens que morreram na mesma altura em que eu os comandava. Mas o Pedro foi uma dor excepcional.

Por mero acaso tínhamo-nos encontrado no fim-de-semana anterior ao acidente em Valada. Ele estava com amigos, mas perante a minha necessidade de ajuda numa pequena reparação da minha pequena embarcação à vela, ficou comigo. “Se lhe desse uma boleia para Santarém”…(como se isso estivesse em causa!)
Pelo caminho falámos de coisas banais mas logo ali ficou combinada uma experiência de navegação à vela.

Quando o telefone tocou para me alertar do que tinha acontecido, custou-me a acreditar no que estava a ouvir : “…Vem depressa que o pessoal está destroçado e eu acho que és preciso aqui…”. Ainda protestei, incrédulo : “…mas eu acabei de estar com ele..:”
Mas como sempre que o telefone toca, tal como o do Pedro tocava quando era preciso, a realidade dura e crua, chamava…
Cerca de 20 minutos antes, saudáramo-nos junto ao Hospital Velho, com o Pedro a gritar na janela do carro : “Então, no Sábado vamos dar uma volta à vela ?” – “Como combinado”, respondi eu.

Foi um dos mais desesperantes acidentes de toda a minha vida: Queria pensar e tinha dificuldade; A maioria dos bombeiros estava de rastos e com dificuldade em reagir; Os habituais mirones, sedentos, estavam a postos e protestavam porque nós tínhamos tapado todo o incidente com lonas. A privacidade de e para com um camarada nosso impôs-se nesse dia. Queríamos todos que aquilo não estivesse a acontecer !
E doía-nos a todos. Não consigo deixar de pensar numa expressão que um camarada, que sempre foi muito duro nestas coisas, repetia, num “gesto” de ternura que raramente se lhe via : “Ah, puto, puto !“
Acabámos por ficar 3 que, dolorosamente, nos arrastámos para acabar a nossa missão. Já enviara para o quartel a maioria do pessoal que estava em choque…

Estávamos preocupados com os pais do Pedro e como lhe daríamos a notícia. Só nessa infeliz noite soube quem era o pai do Pedro (que eu conhecia há muito da cidade) e a mãe. Ironias do destino !

O Pedro foi, para mim, uma daquelas raras oportunidades em que cruzamos com um outro ser humano absolutamente excepcional. Era simpático, cordato, disciplinado, empreendedor, gostava de aprender tudo sobre bombeiros e prometia ser um excepcional bombeiro.

Mantenho no meu actual gabinete a fotografia do Pedro. Faz-me pensar nele e na possibilidade de perdermos pessoas excepcionais por razões que jamais compreenderemos.
Pela estima que tinha pelo Pedro, acredito que o desaparecimento dele terá de ter acontecido por uma razão prática e boa para a Humanidade.
Há velas que não se apagam apenas porque o vento passa por elas. O Pedro era desses !

Por último fique a saber o meu sentimento de ambivalência pela entrega do Diploma do Pedro. Raiva por não lho entregar a ele, alegria porque ele o merecia….

Apresente os meus cumprimentos aos seus pais e receba para si e para a família, especialmente para o sobrinho do Pedro, um abraço do

Pedro Carvalho
Inspector de Bombeiros – Açores

PS – Gostaria de realçar que não sou capaz de fazer elogios “fáceis” e costumo ser razoavelmente frio no que toca a emoções (deformação profissional ?).
Durante o desempenho das minhas funções em Santarém dei 2 louvores, apesar de gostar de ver o trabalho bem feito. Mas, talvez pela personalidade do Pedro, ao escrever estas singelas linhas não pude evitar umas quantas lágrimas…
posted by Pedro Carvalho
Inspector de Bombeiros - Açores
ex-Comandante Bombeiros Municipais de Santarém

Pedro Miguel Beja de Jesus Costa

N 08.04.1983 / F 13.09.2005