Até me considero uma pessoa de choro fácil. Choro
com um bom livro, a ver um filme, às vezes até com vídeos de bebes no youtube.
Mas sinto falta de te chorar. Choro-te pouco. Não chorei no dia do teu funeral.
Lembro-me de tudo nesse dia. Lembro-me de todos os que estiveram ao meu lado,
os que vieram de longe, os que estiveram sempre por perto. Lembro-me de tudo e
lembro-me que não te chorei. Distribuíram-se cartões com uma fotografia tua.
Com o teu melhor sorriso, uma foto do dia em que nasceu o João Maria. Fui eu
que escolhi a tua fotografia. O texto no cartão também fui eu que o escrevi. Fui
eu que distribuí os cartões quase todos. Não aceitei muito bem que chorassem no
teu funeral. Com que direito te choravam não estando eu a chorar? Escolhi o teu
melhor sorriso para que todos guardassem essa recordação. Gostava de ter visto
todos a sorrirem-te de volta, em forma de agradecimento por te terem conhecido.
Houve coro na missa. Cantou-se no teu funeral. Leram-se orações em teu nome.
Devias-me ter visto. Eu a ler no teu funeral, sem chorar. Também li na missa de
7º dia. E na missa de 1º mês.
Acredito mesmo que o céu existe. Não penso muito
nisso mas sei que é onde estás e só por isso já é um lugar bom. Quando morre
alguém teu conhecido imagino o vosso reencontro. Um abraço no céu. Morreu a
prima Graça. Não sei se te lembras dela, mas em oração pedi-te que a recebesses
de braços abertos. Ajudou-te a nascer e dizia-me muitas vezes "o teu irmão
nasceu muito grande, com quase 4kg". A seguir ficava a olhar-me em
silêncio, sem saber se tinha feito bem em falar-me no meu irmão. As pessoas à minha
volta ficaram muito tempo sem utilizar as palavras "morte",
"morreu". Algumas frases ficavam a meio "isso foi antes do teu
irmão (silêncio)" "isso aconteceu depois do acidente do teu
irmão". Tive muitas vezes vontade de gritar ao mundo: o meu irmão morreu. Não está mais aqui comigo.
Nunca o fiz. Na verdade a mim também me custava muito dizê-lo. Ainda custa.
Chorei muito na missa da prima Graça, chorei
compulsivamente. Os funerais são ótimos sítios para se chorar. Ninguém
estranha. Ninguém nos pergunta o que se passa. A certa altura apeteceu-me ter
uma placa comigo a dizer "estou a chorar também pelo meu irmão".
Chorei também pela dor dos familiares mais próximos, porque sei exatamente
aquilo que vão passar nos dias que se seguem ao funeral. Aprender
a viver. Aprender a viver sem a presença de algúem que gostamos muito, que faz parte de nós, que faz parte da nossa vida e da forma como sempre a vivemos. Aprender que o tempo ajuda-nos a aceitar mas as saudades aumentam.
Quase 9 anos sem te ver. Mais de três mil dias de
mim sem ti. Foram tão poucos os dias que te chorei, mas não houve um só que
não me lembrasse de ti, e daquilo que éramos um com o outro. Fazes-me falta.
Vejo nos teus sobrinhos bocadinhos de ti. O João Maria tem o teu feitio, o
Pedrinho o teu sorriso, o Zé Maria por enquanto tem as tuas birras. Tão bom
rever-te neles. A mãe e o pai também procuram neles muitas semelhanças contigo.
Estou diferente. Estou mais velha. Passaram 9
anos. Como vai ser quando nos reencontrarmos? Os anos também passam no céu?
2 comentários:
Que texto lindo Patrícia. Um grande beijinho para ti e para os teus pais
Lindo lindo o texto e o teu sentimento! É de louvar a constante lembrança e homenagem que lhe prestas!
Um beijinho enorme no teu coração e outro para tu Pedro! ✨🌟
Enviar um comentário